Reportagem: “Eu danço!”

Os Pauliteiros de Malhadas têm mais de 100 anos! Ao longo de gerações e gerações, estes grupos de dança tradicional foram exclusivamente constituídos por homens. Mais recentemente e graças à ousadia das mulheres, a dança tradicional dos pauliteiros ganhou uma nova vida, pois as pauliteiras vieram acrescentar alegria e cor à cultura da Terra de Miranda.

As pauliteiras de Malhadas. (PM)

O pai, Hélder Igreja, sempre achou que a dança dos pauliteiros era coisa de homens. Até ao dia, em que foram chamados para uma atuação inesperada, em Moura, no Alentejo. Para a dita atuação havia sete pauliteiros disponíveis. Mas faltava um para completar a formação de oito. A filha, Micaela Igreja, que já participava no trio musical, ao tocar gaita-de-foles, disse: “Eu danço!”. Dançou na posição de guia e dançou muito bem! Foi graças à dança da Micaela que o pai começou a ensaiar o primeiro grupo de pauliteiras de Malhadas. E já lá vão 11 anos! A dançar!

Enquanto a dança dos rapazes é enérgica e os paus batem-se com mais força. A dança das raparigas é mais graciosa e elegante. Por vezes, eles e elas dançam juntos. E entendem-se bem. Nos ensaios, quando falta alguém é normal ver um pauliteiro ou uma pauliteira a dançar no outro grupo. Até porque, dizem, os “llaços”, ou seja, as músicas, são as mesmas. Os pauliteiros são tão estimados na aldeia, que lhes dedicaram mesmo uma escultura em ferro, feita com materiais agrícolas e que se encontra exposta num dos largos da aldeia, a que chamam, o largo do pauliteiro. O renovado interesse por esta dança tradicional é tal, que até as crianças já dançam nos grupos dos “pauliteiricos”.

“Enquanto a dança dos rapazes é enérgica e os paus batem-se com mais força. A dança das raparigas é mais graciosa e elegante.”

https://youtu.be/cqaNnoTDfLE

O(a)s Pauliteiro(a)s são um grupo constituído por 8 dançadore(a)s, cada qual com a sua posição: 4 guias nas pontas (duas direitas e duas esquerdas); e 4 peões no meio (dois direitos e dois esquerdos). É o guia direito, mais perto do trio tocador, quem comanda o grupo.

Tornam-se pauliteiras e conhecem o mundo!

Com a dança, as jovens pauliteiras têm a possibilidade de, em grupo, conhecerem outros países e culturas. Entre as muitas viagens e atuações já realizadas, o Hélder destacou, por exemplo, a viagem à Venezuela. Ao longo de 10 dias, dançaram em locais como a embaixada de Portugal, a Praça Simon Bolívar ou o Centro Cultural de Caracas. Aí, conhecerem muitos emigrantes portugueses, sobretudo da Madeira e da região de Leiria. E até na longínqua Venezuela vieram a descobrir que se estava a formar um grupo de pauliteiros!

Para a Micaela, o mais gratificante nestas viagens é a oportunidade de mostrar a cultura da sua terra noutros lugares. Sobre estas viagens, diz que gostou de todas. Mas destacou Macau, pela oportunidade em conhecer outro continente. Disse que também gostou de ir a França. E em Portugal, recordou a viagem a Viana do Castelo, onde tiveram a possibilidade de ficar vários dias, o que lhes deu permitiu conhecer a região.

“Para a Micaela, o mais gratificante nestas viagens é a oportunidade de mostrar a cultura da sua terra noutros lugares.”

É viajando que nos visitam

A atuação dos pauliteiras noutros países e regiões acaba por trazer ganhos para a Terra de Miranda. Um bom exemplo são as capas de honra mirandesas. As pauliteiras dizem que quando usam as capas de honra, as pessoas ficam curiosas e muitas decidem comprar estas (e outras) peças de artesanato. Também há pessoas que decidem visitar a Terra de Miranda. E quando cá chegam descobrem que a cultura mirandesa não é só a dança dos pauliteiros e a música, é também a gastronomia, o artesanato, o património histórico, a língua, a natureza, as raças autóctones, os usos e costumes e sobretudo as gentes.

“A cultura mirandesa não é só a dança dos pauliteiros e a música, é também a gastronomia, o artesanato, o património histórico, a língua, a natureza, as raças autóctones, os usos e costumes e sobretudo as gentes.”

O(a)s pauliteiro(a)s dão vida à Terra de Miranda

Para além de embaixadores noutros países e regiões, os pauliteiros e as pauliteiras de Malhadas também são ótimos anfitriões para quem nos visita. Na cidade de Miranda do Douro, por exemplo, e à semelhança do que fazem os outros grupos de pauliteiros do concelho, é usual vê-las na receção aos turistas e na animação das ruas da cidade. Para além disso, são convidadas para atuar nas festas locais e regionais, em feiras temáticas, em casamentos, batizados e outras festividades. Para responder a todos estes convites, a associação cultural e recreativa de Malhadas adquiriu recentemente um novo transporte próprio, o que lhes facilita as deslocações.

“Na cidade de Miranda do Douro, por exemplo, e à semelhança do que fazem os outros grupos de pauliteiros do concelho, é usual vê-las na receção aos turistas e na animação das ruas da cidade.”

A associação cultural e recreativa

As pauliteiras e os pauliteiros de Malhadas fazem parte da Associação Cultural e Recreativa – Todas. Tal como acontece com a maioria das associações locais, também esta coletividade é um espaço de encontro, de convívio e de dinamização de atividades. Segundo Victor Córdova, presidente da associação, todos participam, direta ou indiretamente nas atividades. Sejam os filhos, os pais e mesmo os avós. É indiscutível que os pauliteiros e as pauliteiras de Malhadas são os grupos mais conhecidos da associação local. Contudo, o dinamismo desta coletividade deve-se também ao contributo de outros grupos, como são o grupo da gastronomia, o do teatro e o grupo das caminhadas.

No dia de Páscoa, por exemplo, o grupo de gastronomia confeciona o folar comunitário e os sodos (são os conhecidos bolos económicos) para partilhar com toda a comunidade. Reza a tradição, que após a missa da Ressurreição do Senhor, são benzidos pelo senhor padre, para depois serem oferecidos no adro da igreja, num ambiente de convívio e de confraternização.

Outra atividade, promovida pela associação cultural e recreativa, é organizada pelo grupo das caminhadas. No primeiro Domingo de maio, já é tradição caminhar até à Aldeia Nova, por ocasião da festa de São João das Arribas. No decorrer desta peregrinação comunitária, os participantes para além de contemplarem a beleza das paisagens, no planalto mirandês, aprendem também a conhecer a flora e a fauna da região.

No mês de agosto, a associação realiza o festival de folclore de Malhadas, que conta habitualmente com a atuação de grupos nacionais e internacionais, e que em conjunto com os pauliteiros e as pauliteiras locais, embelezam a festa da aldeia.

São todas estas atividades, por norma realizadas em grupo, o que mais anima as pessoas a agir contra o despovoamento desta região e a acalentar a esperança de que é possível continuar a viver na Terra de Miranda.                                                                               

“Tal como acontece com a maioria das associações locais, também esta coletividade é um espaço de encontro, de convívio e de dinamização de atividades. Segundo Victor Córdova, presidente da associação, todos participam, direta ou indiretamente nas atividades. Sejam os filhos, os pais e mesmo os avós.”

HA

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