Opinião: Coesão através da Economia – Joaquim Branco

No passado dia 13 de outubro, a professora Helena Freitas publicou, no JN:52/60, o artigo “Mais coesão territorial para uma governação justa”. Tem razão no diagnóstico: o país continua profundamente desigual, com acentuados contrastes entre litoral e interior, entre áreas metropolitanas e territórios de baixa densidade. As consequências são visíveis no envelhecimento, abandono, perda de massa crítica nas universidades e politécnicos e erosão da confiança nas comunidades.

A sua visão de uma coesão territorial que devolva dignidade e futuro às populações do interior é, sem dúvida, justa e necessária. Contudo, é precisamente na forma de concretizar esse desígnio que as nossas perspetivas divergem. A professora Helena Freitas entende que, ao subordinar a coesão à economia, o Governo fragiliza a equidade e entrega ao mercado o que deveria ser missão do Estado. Daí a sua proposta de regresso a um Ministério da Coesão Territorial, com poderes próprios para planear, redistribuir e coordenar políticas públicas para as regiões de baixa
densidade.

Com todo o respeito pela perspetiva apresentada, vejo a questão de forma algo diferente, pois não considero que a fusão das pastas da Economia e da Coesão seja um erro político, um retrocesso na governação territorial. A sua proposta parte de uma legítima
preocupação de justiça social, com a qual concordo, embora coloque a ênfase menos no motor económico do desenvolvimento do que eu considero necessário.

As regiões do interior não se repovoam apenas com despachos ou fundos, mas com empresas, investimento e rendimento. O despovoamento é, antes de ser social, um fenómeno económico.

A meu ver, a coesão territorial tende a ser o resultado de um território economicamente ativo, mais do que o seu ponto de partida. A criação de um ministério autónomo para a coesão tenderia a acentuar políticas de redistribuição e não de criação de riqueza. Os factos têm indicado que, apesar das sucessivas vagas de programas e fundos, o interior continua a esvaziar-se.

Neste quadro, um Ministério da Economia e da Coesão Territorial, com autoridade real e visão integrada de desenvolvimento territorial, pode ser a mais eficaz resposta, desde que disponha de determinação política e instrumentos coerentes. Esta estrutura deverá articular políticas produtivas, fiscais e de inovação dirigidas a essas regiões, subordinando a economia a uma lógica de coesão sustentável e não o contrário. É por isso que considero que a sua criação, não é um retrocesso.

É também aqui que as ideias dos Drs. Carlos Tavares e Miguel Cadilhe assumem relevância reformista. O Dr. Carlos Tavares (artigo no JN de 13 de janeiro de 2025, antes de assumir a presidência da ACEC) defende uma reforma fiscal territorial, com reduções de IRS e IRC para quem vive e investe fora das áreas metropolitanas, não como privilégio, mas como compensação pelos custos de contexto e pela falta de escala. O Dr. Miguel Cadilhe (artigo publicado nos Cadernos de Economia, Novembro 2018), por sua vez, propõe transformar o Regime Contratual de Investimento (RCI) num exclusivo do interior. Recorda-nos que, entre 2008 e 2017, as regiões de baixa densidade, com cerca de 75% do território, absorveram somente cerca de 27% dos contratos de investimento
celebrados com a AICEP. Vem sublinhando, com razão, que a concentração de grandes projetos públicos como o Novo Aeroporto de Lisboa (NAL), a Terceira Travessia do Tejo (TTT) e o projeto do comboio de alta velocidade (PCT) reforçará a “litoralização” do país e a subordinação da coesão territorial à economia metropolitana. Tornar o RCI um instrumento reservado ao interior seria um passo de coragem económica e política.

Ambas as propostas ilustram uma lógica que em vez de gerir desequilíbrios por via orçamental, procuram corrigi-los pela via económica e não apenas social. Trata-se de colocar o Estado no papel de orientador que cria condições para o investimento e o emprego florescerem onde hoje escasseiam e é nessa dinâmica que nasce a verdadeira coesão.

Além disso, as políticas públicas proactivas devem favorecer mobilidade social, promover a deslocação de serviços centrais do Estado e incentivar a fixação de talento fora das grandes cidades. O Estado tem o dever de induzir investimento, reduzir custos de contexto e canalizar apoios fiscais e financeiros, tanto a empresas como a trabalhadores. Os efeitos positivos esperados serão múltiplos com aumento da produtividade e da qualidade de vida nas áreas metropolitanas, ainda maior bem-estar nas regiões do interior e uma redistribuição demográfica mais equilibrada.

Mais do que uma missão política e moral, entendo a coesão como uma consequência estrutural do desenvolvimento económico. É verdade que a falta de regionalização permanece uma fragilidade nacional e, por conseguinte, devemos continuar a pugnar por um modelo regional com legitimidade democrática própria. Mas, até que essa reforma se concretize, integrar a política de coesão numa estratégia económica robusta é a via mais realista e transformadora.

O equilíbrio entre economia e coesão é o que um verdadeiro Ministério da Economia e da Coesão Territorial deve alcançar e, por isso, devemos dar-lhe o benefício da dúvida, não por muito tempo, pois o País já esperou demasiado.

Joaquim Branco

Imagem: Britannica

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